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sábado, 5 de setembro de 2020

Educação Formal e Educação não formal - diferenças entre duas educações

 

A educação na escola (educação formal) pode ser resumida como aquela que está presente no ensino escolar institucionalizado, cronologicamente gradual e hierarquicamente estruturado. A educação não-formal, porém, define-se como qualquer tentativa educacional organizada e sistemática que, normalmente, se realiza fora dos quadros do sistema formal de ensino, não se deve confundi-la com a informal, que é aquela na qual qualquer pessoa adquire e acumula conhecimentos, através de experiência diária em casa, no trabalho e no lazer.




"A primeira é formal por ter sido estabelecida pelo governo como educação padrão. Ela é praticamente obrigatória e se não seguir o padrão certamente lhe trará riscos, basta analisar como são feitos os filtros de contratação de profissionais nas empresas, a pessoa que esta recrutando recebe um currículo e a primeira coisa que ela faz é descer até o item Formação Acadêmica, se não for uma faculdade de primeira linha e um bom curso, o currículo automaticamente vai para o lixo.
A educação formal tenta transferir o conhecimento que o professor tem, e muitas vezes não tem, para o aluno, com a ajuda de livros e materiais de apoio. Durante uma hora ou mais o professor se dirige aos alunos falando sem parar. O grande problema é que o ser humano não consegue manter-se focado por muito tempo, muito do que é falado não é escutado, e muito pouco do que é escutado é aprendido. Não é a toa que a educação formal exige um esforço pessoal extra classe chamado lição de casa, só assim o aluno consegue realmente aprender o que foi ensinado."
Faremos também o destaque sobre o espaço e o tempo na escola necessário tanto para o educando quanto para o educador. Pois, este influenciará no ensino, na aprendizagem, na relação dos os membros escolares, desde o aluno até a coordenação na mesma.

A Educação na escola

A vivência do cotidiano escolar significa uma experiência de vida, localizada em um espaço, cuja materialização é muito objetiva. O conteúdo da experiência escolar varia de sociedades, de culturas, de escolas, de sujeitos.

Uma das tarefas mais complexas da coordenação pedagógica e dos dirigentes é reordenar os espaços, os tempos e o trabalho dos profissionais de modo a permitir que diferentes propostas pedagógicas se tornem realidade, acontecendo um processo real e complicado de comunicação entre os sujeitos. Ao organizar o tempo e o espaço escolar, não podemos perder na abstração das normas.

Para construir uma nova forma de organização dos tempos, é preciso superar a idéia de cronometrar o tempo, organizado em etapas em ascensão, calcado na tecnologia de aceleração, da qualidade total e da produtividade. Reorganizar o tempo na escola é dar aos alunos condições adequadas para pensar, agir e interagir com o conhecimento e com a vida.

Através de sindicatos e de fazer educativo no dia-a-dia escolar, os professores inovam o currículo, questionam o conteudismo das práticas pedagógicas, constroem projetos políticos-pedagógicos, recuperam a historia de vida dos alunos e da comunidade, interferem no processo de gestão e administração da escola, transgridem normas burocráticas e rígidas e indagam sobre a organização dos tempos e espaços.
A educação escolar tem como objetivo repassar conhecimentos segundo uma metodologia de ensino que opta pela fragmentação dos conteúdos e considera ser a retenção do aprendizado o objetivo final da atividade escolar, por mais que se insista em negar esse objetivo. O processo educacional relaciona-se com os fins da educação escolar. 
Quase todos os educadores têm consciência de que o objetivo da educação é a formação de sujeitos livres, autônomos, felizes e participantes da vida social, logo, cidadãos responsáveis.



Atualmente as exigências da educação são para o desenvolvimento e implemento de trabalhos escolares, nos quais os alunos sejam desafiados a pensar/refletir e a propor soluções para questões e problemas contemporâneos, sendo professor e aluno chamados de pesquisadores em interação.

O aluno deve desenvolver sua criatividade, sugerir, propor e solucionar problemas, levantar e reelaborar hipóteses, saber tomar decisões, desenvolver a capacidade de expressar por varias linguagens – trabalhando com diversas fontes de conhecimentos. Afinal, conhecer é descobrir a razão das coisas, é procurar soluções para o que não entendemos, é observar, questionar, registrar, analisar, generalizar.

Importante também à educação é a interdisciplinaridade, que é um principio mediador entre as diferentes disciplinas, elementos teórico-metodológico da diferença e da criatividade, de transversalidade que é um procedimento didático-pedagógico. Porém, não basta que se interagem conteúdos, a postura interdisciplinar envolve uma determinada forma de conceder e se relacionar com o conhecimento produzido socialmente. O envolvimento é condição para a prática de interdisciplinaridade. Um projeto de interdisciplinaridade de trabalho ou de ensino consegue captar a profundidade das relações conscientes entre as pessoas e entre pessoas e coisas.

Na reflexão dos princípios norteadores de uma prática interdisciplinar, é fundamental a compreensão de que a aprendizagem escolar é parte de um processo maior que é a vida social, na qual alunos e professores são sujeitos que compartilham espaços e tempos. Uma política interdisciplinar pressupõe uma renovação de idéias, valores e concepções. O que caracteriza a atitude interdisciplinar é a ousadia da busca, da pesquisa: é a modificação num exercício de pensar.

A interdisciplinaridade pode ser dificultada de acordo com o tempo e o espaço no qual a escola é organizada.


EDUCAÇÃO NÃO-FORMAL

Na educação não-formal a cidadania é o objetivo principal, e ela é pensada em termos coletivos, se dá por meio da prática social. A educação não-formal caracteriza-se por não ter a importar em desenvolver um currículo predefinido, que se faz principalmente baseado em desejos, necessidades e interesses das pessoas que constituem os grupos envolvidos em ações e práticas desse campo educacional.

As propostas da educação não-formal têm como objetivo central enriquecer a biografia dos indivíduos, ampliando a gama de vivências e experiências formativas de crianças, jovens, adultos e idosos. Nela destaca-se o encontro de gerações, a mistura de idades, a não obrigatoriedade de frequência e a ocorrência de ações e experiências em espaços e tempos mais flexíveis, não restritos ou fixados por órgãos reguladores.


Ela designa em um processo com diversas dimensões, que correspondem a suas áreas de abrangência, que são:

a) a aprendizagem política dos direitos dos indivíduos enquanto cidadãos;

b) a capacitação dos indivíduos para o trabalho, por meio da aprendizagem de habilidades e/ou desenvolvimento de potencialidades;

c) a aprendizagem e exercício de práticas que capacitam os indivíduos a se organizarem com objetivos comunitários, voltadas para a solução de problemas coletivos cotidianos;

d) a aprendizagem dos conteúdos da escolarização formal, escolar, em formas e espaços diferenciados;

e) a educação desenvolvida na e pela mídia, em especial a eletrônica.

O que diferencia a educação não-formal da informal é que na primeira existe a intencionalidade de dados sujeitos em criar ou buscar determinadas qualidades e/ou objetivos, é define por uma ausência, em comparação ao que há na escola (algo que seria não-intencional, não-planejamento, não-estruturado), tomando como único paradigma à educação formal.


A educação informal decorre de processos espontâneos ou naturais, ainda que seja carregada de valores e representações, como é o caso da educação familiar, por exemplo, a educação transmitida pelos pais na família, no convívio com amigos, clubes, teatros, leitura de jornais, livros, revistas etc.

Para fins didáticos os campos da educação não-formal dividem-se em: destinado a alfabetizar ou transmitir conhecimentos que historicamente tem sido sistematizado pelos homens e mulheres, planejados para as clientelas sujeitos das ações educativas, com uma estrutura e uma organização distinta das organizações escolares, abrangendo a área que se convencionou chamar de educação popular e educação de jovens e adultos, e, abrange a educação gerada no processo de participação social, em ações coletivas não voltadas para o aprendizado de conteúdos da educação formal.



Cita Maria da Glória Gohn,

“Até os anos 80, a educação não-formal foi um campo de menor importância no Brasil, tanto nas políticas públicas quanto entre os educadores… Em alguns momentos, algumas luzes foram lançadas sobre a educação não-formal, mas ela era vista como uma extensão da educação formal, desenvolvida em espaços exteriores ás unidades escolares”. (p.91)

Antes esta educação era vista como uma união de processos esboçados de obtenção à participação indivíduos em áreas de extensão rural, animação comunitária, treinamento vocacional ou técnico, educação básica, planejamento familiar etc.

Nos anos 90, a educação não-formal alcançou modificação na economia, na sociedade e na área trabalhista, passando-se a estimular os processos de aprendizagem em grupos e a dar-se amplo destaque aos valores culturais que articulam as ações dos indivíduos. Falou-se de uma inovação na cultura organizacional que, em geral, exige a aprendizagem de habilidades extra-escolares. Têm colaborado também agencias e organismos internacionais, como a ONU e a UNESCO, bem como alguns estudiosos.

No Brasil, a educação não-formal nos últimos anos, vem se caracterizando por propostas de trabalho voltadas para a camada mais pobre da população, promovidas pelo setor público ou idealizadas por diferentes segmentos da sociedade civil, muitas vezes em parceria, com o setor privado, desde ONGs a grupos religiosos e instituições que mantêm parcerias com empresas. A divulgação também vem sendo explorada pela atuação da educação não-formal, preocupação e ações relativas a questões que envolvem a ecologia e problemas com o meio ambiente.

DISTINÇÃO ENTRE EDUCAÇÃO FORMAL E NÃO-FORMAL





Concluo que a sociedade, independente do grau de conhecimento que ela obtenha, tem que haver educação formal tanto quanto educação não-formal. Pois, não é limitado o lugar de aprendizagem, obtemos novos conceitos numa leitura de um livro assim como numa simples conversa amigável – (informal).

A educação não-formal, apesar de apontar e oferecer outras possibilidades diferentes das escolares, não burocratizadas, menos hierarquizadas, mais rápidas e algumas propostas mais econômicas, não deve tomar para si a salvação do sistema formal de ensino. Nesse caso, estaria contribuindo, inclusive para o desmanche da escola pública e para a desresponsabilização estatal/pública para com esse setor.

Penso que, tanto as oportunidades de acesso à formação e aquisição de conhecimentos oferecidos pela escola devem ser acessíveis a todos, como também as oportunidades oferecidas pelas diversas propostas de educação não-formal, favorecendo um trânsito democrático e igualitário dos “usuários” dessas diferentes e importantes vivências de socialização e formação.


A educação escolar ou a não-formal é como deveria ocorrer de fato, independente do contexto em que se dá o processo educacional, ele ocorra com qualidade (ou ao menos com a melhor qualidade dentro das possibilidades oferecidas e determinadas pelo momento sócio-histórico em questão). É de extrema importância deixar claro quais são essas condições, quais são os limites impostos por elas e quais as alternativas para superá-las.

Foi, e é o momento de redefinição de papeis, resignificação e reconstrução das identidades institucionais. Cabe salientar que o surgimento da educação não-formal não se dá com o objetivo de ocupar o espaço ou substituir o papel da educação formal e da informal, mas para dividir e partilhar os diferentes fazeres desse novo tempo.


A educação tem que ser livre, no espaço e no tempo, pois, o importante é o aprendizado necessário. Se possível de forma interdisciplinar.


REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

GOHN, Maria da Glória. Educação não-formal e cultura política: impactos sobre o associativo do terceiro setor. São Paulo: Cortez, 2001.



quinta-feira, 30 de agosto de 2018

Conhecimento e bondade (Platão)


                Conhecimento e bondade (Platão)

No grego antigo, várias palavras traduziam distintos aspectos da felicidade. A principal delas era eudaimonia, derivada dos termos eu ("bem-disposto") e daimon ("poder divino"). Trata-se da felicidade entendida como um bem ou poderconcebido pelos deuses. Subentendia-se que, para mantê-la, a pessoa deveria conduzir sua vida de tal maneira a não se indispor com as divindades, para o que era preciso sabedoria. Mesmo assim, ainda corria o risco de perder esse bem ou poder se os deuses assim o desejassem, por qualquer motivo arbitrário.

Isso significa que a felicidade era tida como uma espécie de fortuna ou acaso - enfim, um bem instalável que dependia tanto da conduta pessoal, como da boa vontade divina (cf. Lauriola, De eudaimonia à felicidade..., Revista Espaço Acadêmico, n. 59).

Platão (427-347 a.C.) - era considerado por boa parte dos estudiosos o primeiro grande filósofo ocidental, juntamente com seu mestre, Sócrates - foi um dos principais pensadores gregos a se lançar contra essa instabilidade, em busca de uma felicidade estável, postura que caracterizará de forma marcante a ética eudemonista¹ grega.
No entendimento de Platão, o mundo material - aquele que percebemos pelos cinco sentidos - é enganoso. Nele tudo é instável e por meio dele não pode haver felicidade. Por isso, para esse filósofo, o caminho da felicidade é o do abandono das ilusões dos sentidos em direção ao mundo das ideias, até alcançar o conhecimento supremo da realidade, correspondente à ideia do bem. Vejamos como ele chegou a essa conclusão.

A vida feliz de uma pessoa dependeria da devida subordinação e harmonia entre essas três almas. A alma racional regularia a irascível, e esta controlaria a concupsente, sempre com a supervisão da parte racional. Há, portanto, uma primazia da parte racional sobre as demais.

Para apoiar essa tarefa, Platão propunha duas práticas:
  • Ginástica - atividade física por meio da qual a pessoa dominaria as inclinações negativas do corpo; e
  • Dialética - método de dialogar (praticado por Sócrates) pelo qual se ascenderia progressivamente do mundo sensível (que ele considerava verdadeiro), onde se encontram as ideias perfeitas (que correspondem ao máximo grau de conhecimento e à realidade verdadeira).
Por meio dessas práticas - especialmente da dialética - a alma humana penetraria o mundo inteligível², conhecido com mundo das ideias, e se elevaria sucessivamente mediante a contemplação das ideias perfeitas, até atingir a ideia suprema, que é a ideia do bem.

Essa supremacia deve-se a que, para Platão, o bem é a causa de todas as coisas justas e belas que existem, incluindo as outras ideias perfeitas, como justiça, beleza coragem. Sem o bem não há nenhuma delas, inclusive a ideia perfeita de felicidade.

                                            

Em resumo, podemos dizer que, para Platão, a felicidade é o resultado final de uma vida dedicada a um conhecimento progressivo até se atingir a ideia do bem, o que poderia ser sintetizado na seguinte fórmula: conhecimento = bondade = felicidade. As três coisas, quando ocorrem em máxima expressão, andariam sempre juntas, mas o caminho partiria do conhecimento.

Além disso, para Platão, a ascensão dialética equivaleria não apenas a uma elevação cognoscitiva (isto é, de conhecimento), mas também a uma evolução do ser da pessoa (elevação ontológica, no jargão filosófico).
Simplificando bastante, podemos dizer que aquele que alcança o conhecimento verdadeiro (que culmina a ideia do bem) torna-se um ser "melhor" em sua essência e, por isso, vive mais feliz.

________

GLOSSÁRIO:
¹eudemonista: relativo à felicidade, ou que tem a felicidade como valor fundamental ou principal objetivo
²inteligível:  que só pode ser apreendido pelo intelecto, por oposição ao sensível, isto é, ao que só pode ser apreendido pelos sentidos.


quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

A utilidade do inútil




O livro A Utilidade do Inútil, publicado pela Kalandraka, foi traduzido para 20 línguas, está em 30 países e já vendeu mais de 200 mil exemplares. Neste, o professor italiano da Universidade de Calabria, filósofo e especialista na obra de Giordano Bruno, critica a lógica do lucro que chegou ao mundo do ensino e da investigação e propõe uma reflexão sobre quais são os verdadeiros saberes que podem ajudar a sair da crise.



A utilidade do inútil Um manifesto Nuccio Ordine Não é verdade – nem mesmo em tempos de crise – que só é útil o que produz lucro ou tem uma finalidade prática. Existem saberes considerados “inúteis” que são indispensáveis para o crescimento da humanidade. Útil, portanto, é tudo aquilo que nos ajuda a sermos melhores e melhorarmos o mundo. Sucesso de crítica e de público, traduzido para mais de 15 idiomas, A utilidade do inútil mostra como a lógica utilitarista e o culto da posse acabam por murchar o espírito das pessoas, pondo em perigo não só a cultura, a criatividade e as instituições de ensino, mas valores fundamentais como a dignidade humana, o amor e a verdade. Para respaldar e fortalecer essa discussão, o italiano Nuccio Ordine constrói um mosaico de citações de grandes filósofos e escritores, uma espécie de manifesto abaixo-assinado por Platão, Montaigne, Kant, Shakespeare, Victor Hugo, Cervantes, Dickens, Baudelaire, García Lorca, Stevenson, Calvino, García Márquez, David Foster Wallace... Completa o livro um ensaio do famoso educador americano Abraham Flexner, inédito em português, que prova como também as ciências exatas nos ensinam a utilidade do inútil. Numa época onde cortes no orçamento de cultura, privatização de pesquisas e fechamento de livrarias são questões frequentes em diversos países, a obra é um rico material para repensarmos o valor da arte, da poesia, da curiosidade e dos saberes sem aplicações práticas ou usos comerciais. NUCCIO ORDINE é professor de literatura italiana na Universidade da Calábria, e atua como membro ou professor visitante em diversas universidades e institutos de pesquisa de prestígio nos EUA e na Europa. Com livros traduzidos para mais de 15 idiomas, dirige coleções de clássicos na Itália e na França e colabora com o jornal Corriere della Sera. É doutor honoris causa da UFRGS e um dos principais estudiosos da obra de Giordano Bruno, sobre quem escreveu A cabala do asno (2006) e O umbral da sombra (2009).


https://www.youtube.com/watch?v=1WSKJIMyS6U


Esse é o grande problema da contemporaneidade: temos gente super especializada e que perdeu o sentido geral e global do saber. Hoje as escolas e as universidades preparam os alunos para seguirem uma especialização e isso é muito perigoso. Estas devem proporcionar uma cultura geral. Einstein já dizia que a especialização mata a curiosidade e esta está na base do avanço da ciência e da tecnologia. Por exemplo, a actual directora do CERN [o laboratório europeu de física de partículas] é uma italiana [Fabiola Gianotti] que fez estudos clássicos no liceu, aprendeu piano durante dez anos, mas é uma grande física. Os maiores arquitectos italianos, como Renzo Piano, fizeram estudos clássicos. Portanto é preciso ter uma cultura geral de base.


https://www.youtube.com/watch?v=bVBrccbHetc

O que é preciso mudar no ensino?
"O meu livro é um grito de alarme. Quando pergunto aos meus alunos por que estão na universidade, respondem-me que é para obter um diploma. Um diploma não serve para nada! Há uma visão utilitarista da educação que mata a ideia de escola. Vamos à escola para sermos pessoas cultas! Para sermos pessoas melhores, para sermos éticos, não importa o curso."
Na apresentação do meu livro, viajei de Norte a Sul de Itália e os estudantes diziam-me: “Professor, adoro os gregos e os latinos, mas os meus pais perguntam-me ‘o que vais fazer com literatura? Porque não te inscreves num curso onde possas vir a ganhar dinheiro?’ Isto é a corrupção da ideia do que deve ser a universidade! É corromper os estudantes. Temos médicos que o são porque ganham muito dinheiro e não por razões humanitárias e não pelo que prometem no juramento de Hipócrates. Esta corrupção – a ideia de ganhar muito dinheiro – atravessa a sociedade inteira, chega à política, à economia. Por isso temos corrupção no mundo inteiro.
Costumo ler uma história belíssima de Kavafis [poeta grego, 1863-1933] sobre Ítaca, a história de Ulisses, que diz que a experiência da viagem é que fará de ti um homem rico, fará de ti um homem melhor. Se não fizeres essa experiência, de nada te servirá chegar a Ítaca.

O que isso significa?
Significa que devemos estudar por amor ao conhecimento, por amor à aprendizagem, para que sejamos homens e mulheres livres. Os alunos têm de compreender que não há saber sem conhecimento e que só se é livre se formos sábios. E isso não têm nada a ver com o mercado e com aquilo que este pede.

No seu livro critica as universidades-empresa.
Contesto a ideia de que as universidades sejam empresas. A nossa missão não deve ser vender diplomas que os estudantes compram. Isso é uma enorme corrupção. A escola não pode ser uma empresa porque a lógica da educação não é a do mercado. O princípio da educação é aprender a ser melhor, para si mesmo e não para o mercado. O que vemos na City em Londres [no centro financeiro britânico] são pessoas com elasticidade mental, pessoas que vêm dos estudos clássicos ou da filosofia porque compreendem melhor o mundo do que os especialistas em economia ou programação.




As consequências da Declaração de Bolonha, que veio alterar a forma como o ensino superior está organizado, são negativas?

Bolonha foi muito dura para o futuro do ensino. Há coisas graves, a começar no léxico, as palavras não são neutras, têm significado, e quando as primeiras palavras que os alunos aprendem, quando chegam ao ensino superior, é “créditos” e “débitos”, impomos uma lógica da economia no ensino. As universidades recebem financiamento consoante os seus resultados, quanto mais alunos com sucesso, mais financiamento recebem, e assim baixa-se o nível para todos passarem. Ninguém vai avaliar a qualidade, só a quantidade. Deixa-se de financiar as pesquisas de base, mas se não fossem essas não seria possível fazer ciência. As grandes revoluções são fruto de pesquisas de base. Por isso, é preciso redireccionar as coisas porque o inútil de hoje pode ser o útil de amanhã.


Que modelo de escola é que defende?
Costumo contar aos meus alunos que Albert Camus, quando ganhou o Nobel da Literatura, fez duas coisas: escreveu uma carta à sua mãe e uma ao seu professor da escola média [3.º ciclo do básico], Louis Germain. Foi ele que o incentivou a continuar a estudar, porque Camus era bom aluno, embora pobre. Camus agradeceu ao seu professor tudo o que fez por ele. É essa a escola que quero! Uma escola em que o professor e o aluno estejam no centro e os professores não estejam soterrados em burocracias. Os professores perderam a paciência para ensinar e a paciência tem de estar no centro da pedagogia.



E os pais? O que podem fazer para criar seres humanos mais completos: dar um computador ou um smartphone ou levar os filhos ao teatro ou a um concerto?
Comprar o computador e levá-los ao teatro, a ler poesia, a ouvir um concerto porque tudo isso pode mudar a vida de uma pessoa. A música pode fazer milagres, como pode a ciência. O poder libertado do utilitarismo pode tornar a humanidade mais humana.









terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

PARA ALÉM DE UMA EDUCAÇÃO DOMESTICADORA: Um Diálogo com Noam Chomsky


Nessa entrevista, Noam Chomsky aborda a temática da educação e defende a idéia de que as escolas deveriam ser espaços que envolvessem os alunos na prática da democracia. Em uma forte crítica ao sistema educacional estadunidense, afirma que este tem sido um espaço de doutrinação da juventude. Insiste ainda que o mito da objetividade tem favorecido a manutenção dos grupos dominantes. Falando sobre o que as escolas poderiam ser, declara que um bom professor sabe que a melhor maneira de ajudar os alunos a aprender é deixá-los descobrir a verdade por eles próprios. Segundo Chomsky, o verdadeiro conhecimento vem através da descoberta da verdade e não através da imposição de uma verdade oficial interesses das grandes corporações. 


Donaldo Macedo – As suas declarações sugerem, e eu concordo, que nas sociedades abertas a censura está, em grande parte, integrada no tecido do qual depende a propaganda e a sua tentativa de “controlar a mente pública”. Porém, na minha perspectiva, a censura numa sociedade aberta difere substancialmente da forma de censura exercida em sociedades totalitárias. O que eu tenho observado nos Estados Unidos é que a censura não só se manifesta de um modo diferente, mas também que depende de uma forma de auto-censura. Quais são os papéis dos meios de comunicação social e da educação neste processo? Noam Chomsky – Aquilo que você chamou de auto-censura começa em muito tenra idade, através de um processo de socialização que é também uma forma de doutrinação que funciona contra o pensamento independente, em favor da obediência. As escolas funcionam como um mecanismo para essa socialização. O objetivo é evitar que as pessoas façam as perguntas que interessam acerca de questões importantes que as afetam diretamente, a elas e a outros. Nas escolas não se aprende apenas conteúdos. Como já mencionei, se quiser tornar-se num professor de matemática, não basta aprender muita matemática. Adicionalmente é preciso aprender como se comportar, como se vestir de um modo apropriado, que tipos de questões podem ser levantadas, como encaixar (ou seja, como se adaptar), etc. Se mostrar demasiada independência e questionar o código da sua profissão com demasiada freqüência, o mais provável é ser excluído do sistema de privilégios. Assim, rapidamente aprende que, para ter sucesso, tem que servir os interesses do sistema doutrinal. Tem que ficar calado e instilar nos seus estudantes as crenças e doutrinas que servirão os interesses daqueles que detêm o verdadeiro poder. A classe empresarial e os seus interesses privados são representados pelo elo estado-empresa. Mas as escolas estão longe de ser o único instrumento de doutrinação. Outras instituições se conjugam para reforçar o processo de doutrinação. Vejamos aquilo que nos impingem pela televisão. Pedem-nos para assistirmos a um conjunto de programas vazios, concebidos como entretenimento, mas desenhados para desviar a atenção das pessoas dos seus verdadeiros problemas ou de identificarem as fontes dos seus problemas. Assim, esses programas vazios socializam o espectador, para que se torne num consumidor passivo. Uma das formas de gerir uma vida frustrada é comprar cada vez mais coisas. Os programas exploram as necessidades emocionais das pessoas e mantêm-nas desligadas das necessidades dos outros. A medida que os espaços públicos se desintegram, as escolas e os poucos espaços públicos que restam trabalham para tornar as pessoas boas consumidoras. 


http://www.curriculosemfronteiras.org/vol4iss1articles/chomsky.pdf